Ascensão Funcional: saiba o que fazer quando o Município silencia sobre o seu direito

A valorização do servidor público é um princípio basilar para o bom funcionamento da Administração.

Em diversos municípios brasileiros, servidores públicos que buscaram qualificação e cumpriram integralmente os requisitos legais para ascensão funcional enfrentam um obstáculo preocupante: a omissão da Administração Pública.

A situação, infelizmente, não é isolada – trata-se de um padrão que se repete em várias regiões, muitas vezes ancorado em uma leitura equivocada da legislação e dos princípios constitucionais.

Apesar de se tratar de um direito assegurado por lei, ainda se observa a resistência de muitos entes públicos em efetivar o enquadramento funcional sob argumentos frágeis, como a suposta ausência de previsão orçamentária.

Essa postura desconsidera que a ascensão funcional não é uma benesse concedida pela Administração – mas sim um direito subjetivo do servidor.

A Lei é Clara: Requisitos Objetivos e Enquadramento Automático

Tomemos como exemplo o caso de Juazeiro do Norte (CE). A Lei Municipal nº 3.608/2009, com as alterações trazidas pelas Leis nº 4.201/2013 e nº 4.233/2013, estabelece de maneira inequívoca que a ascensão pela via acadêmica ocorre mediante enquadramento automático, desde que preenchidos os requisitos legais:

  • Protocolo do requerimento administrativo;
  • Apresentação de diploma (graduação, pós, mestrado ou doutorado);
  • Autenticação em cartório;
  • Afinidade do curso com o cargo exercido.

Não há qualquer menção à necessidade de interstício ou de previsão orçamentária posterior. Ao contrário, o texto legal deixa claro que o direito nasce com o cumprimento dos requisitos – e deve ser implantado de forma imediata, inclusive com efeitos financeiros retroativos.

Omissão Administrativa: Violação dos Princípios da Administração Pública

Negar a ascensão funcional sob justificativa orçamentária ou simplesmente ignorar requerimentos administrativos não é apenas injusto – é ilegal. Trata-se de uma afronta direta aos princípios constitucionais da legalidade, moralidade, eficiência e razoável duração do processo (CF/88, art. 37).

Em um dos casos emblemáticos de Juazeiro do Norte, um professor viu seu direito negado mesmo após ter sido inicialmente incluído em uma lista de beneficiários.

Felizmente, a exclusão posterior e imotivada foi corrigida pelo Poder Judiciário, que concedeu o pedido liminar, reconhecendo o seu direito ao enquadramento.

A decisão judicial destacou que se trata de ato administrativo vinculado, não havendo margem para análise de conveniência do ente público e a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Ceará já consolidou entendimento nesse sentido:

“A administração pública afrontou diametralmente o princípio da legalidade e, por consequência, violou o direito da autora, ao não conceder a ascensão funcional requerida.” (TJCE – Apelação Cível – 0065337-87.2016.8.06.0112)

Judiciário: Guardião da Legalidade e da Dignidade do Servidor

Diante da inércia administrativa, o Judiciário tem cumprido seu papel de restaurar a legalidade.

Em decisão recente, foi determinado o enquadramento funcional de servidor, professor da rede municipal, no prazo de 15 dias, sob pena de multa diária, reconhecendo não só a violação normativa, mas também os impactos financeiros e emocionais sobre o profissional, já que se trata de verba de caráter alimentar.

Na decisão proferida, o magistrado constatou a probabilidade do direito da servidora e o perigo de dano decorrente da omissão municipal. Eis um trecho marcante da decisão:

“Verifico que ambos os requisitos [do art. 300 do CPC] encontram-se satisfatoriamente demonstrados. Quanto à probabilidade do direito, observo que a autora fundamenta sua pretensão no art. 40 da Lei Municipal nº 3.608/2009, com redação dada pelas Leis nº 4.201/2013 e nº 4.233/2013, que estabelece que a ascensão funcional pela via acadêmica será concretizada mediante enquadramento automático, dispensado qualquer interstício temporal.”

A Constituição é clara ao atribuir prioridade aos créditos de natureza alimentícia, e a jurisprudência reforça que, diante do preenchimento dos requisitos legais, a progressão não depende de disponibilidade orçamentária específica.

O que os Servidores Devem Saber

Você, servidor ou servidora, que preenche os requisitos legais para ascensão funcional, não precisa aguardar indefinidamente pela “boa vontade” do Município. A lei está ao seu lado e o Poder Judiciário, quando provocado, tem reconhecido esse direito de forma célere e efetiva.

A negativa administrativa ou a ausência de resposta ao requerimento formulado, quando contrários ao que determina a legislação, não devem ser aceitos com passividade.

Buscar orientação jurídica é essencial para garantir que seu direito não seja soterrado pela inércia estatal.

A valorização do servidor não se esgota em discursos – ela se concretiza no respeito à legalidade. Negar ascensão funcional sob fundamentos frágeis é perpetuar desigualdades e desconsiderar o esforço daqueles que dedicam suas vidas ao serviço público.

Servidor, se você preenche os requisitos legais e teve seu direito ignorado, não espere pela boa vontade do ente público.

Caso haja alguma dúvida, sigo à disposição.

Até o próximo!