Conciliar as demandas da vida funcional com responsabilidades familiares e pessoais pode ser desafiador para muitos servidores públicos. Esse desafio se intensifica especialmente quando envolve o cuidado de um familiar com deficiência ou quando o próprio servidor é uma pessoa com deficiência e necessita de condições diferenciadas para exercer suas funções com dignidade e autonomia.
Nesses contextos, a legislação brasileira garante um importante instrumento de proteção: o direito à redução da jornada de trabalho, sem necessidade de compensação e sem prejuízo salarial.
Quem tem direito?
O artigo 98, §§2º e 3º da Lei nº 8.112/90 assegura o direito ao horário especial, nos seguintes casos:
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Ao servidor que é pessoa com deficiência, desde que a necessidade seja confirmada por junta médica oficial;
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Ao servidor responsável por cuidar de filho, cônjuge ou dependente com deficiência, igualmente mediante comprovação médica da necessidade de acompanhamento.
Trata-se, portanto, de um direito que contempla duas situações distintas, mas igualmente legítimas:
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O servidor que, por conta de uma deficiência, precisa de um regime de trabalho ajustado às suas condições de saúde e bem-estar;
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O servidor que presta cuidados diretos e contínuos a uma pessoa com deficiência sob sua responsabilidade legal ou familiar.
Em ambos os casos, a legislação é objetiva: não há exigência de compensação de horário, nem redução na remuneração.
O entendimento do STF: decisão histórica e definitiva
Com o objetivo de uniformizar a aplicação desse direito em todo o território nacional, o Supremo Tribunal Federal julgou o Recurso Extraordinário nº 1237867, com repercussão geral reconhecida, e firmou a seguinte tese:
“Aos servidores públicos estaduais e municipais é aplicado, para todos os efeitos, o art. 98, §2º e §3º, da Lei 8.112/1990.”
Essa decisão tem caráter vinculante e impede que estados e municípios utilizem a ausência de previsão legislativa própria como justificativa para negar o direito ao horário especial.
Trata-se de um avanço não apenas jurídico, mas também social e institucional, pois promove a efetivação de direitos fundamentais, como o princípio da dignidade da pessoa humana e a proteção integral da pessoa com deficiência.
Como requerer o direito?
Para solicitar o horário especial, o servidor deve seguir os seguintes passos na via administrativa:
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Protocolar requerimento formal junto à entidade onde atua;
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Anexar laudos e documentação médica que comprovem a deficiência e a necessidade de acompanhamento ou adaptação da jornada;
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Submeter-se à perícia médica oficial, conduzida por junta da própria instituição, que confirmará a situação apresentada.
Caso o pedido seja indeferido, seja por negativa expressa ou por omissão administrativa, o servidor poderá buscar a via judicial para a efetivação do direito. A jurisprudência tem sido amplamente favorável, com base na legislação vigente e no precedente firmado pelo STF.
Concusão:
A jornada reduzida sem compensação e sem prejuízo salarial é um direito previsto em lei, respaldado pelo entendimento da mais alta Corte do país.
Seu reconhecimento pela Administração Pública não depende de benevolência, mas sim de respeito à legalidade e à inclusão. Garantir esse direito é permitir que o servidor exerça suas funções com dignidade, seja cuidando de si, seja assegurando o cuidado a quem precisa de acompanhamento constante.
Como advogada especializada na defesa dos direitos dos servidores públicos, reafirmo: conhecimento jurídico é ferramenta de proteção.
Até o próximo!